quinta-feira, 13 de dezembro de 2007

Ansiedade

Se olha no espelho e pensa “a saia está curta demais”, troca pela calça e pensa “mostrando pele de menos”, coloca uma blusa com um decote e “tudo escuro demais”, volta para a saia e com um sapato rasteiro resolve parcialmente o problema da falta de pano da saia. Perfume nos locais mais importantes: Pescoço, colo e pulsos. Blush para deixar as bochechas rosadas e o rímel de todos os dias, seguido do curvex para que se sinta mais feminina.
Olha para o telefone que não toca, a coragem de ligar se esvai. Olhares no espelho, ensaios de um sorriso. A aspereza das mãos de motorista disfarçada com hidratante sempre na bolsa. Checa-se o hálito. Olhar no espelho por todos os ângulos, procurando manchas, marcas, qualquer detalhe. Precisava voltar a malhar, já estivera mais magra. A distância que mantinha do cigarro desde a noite passada deveria ser recompensada, ainda mais se pensar na tensão que todo aquele “mais será?” impõe e no quanto a tensão a aproximava dos famigerados.
Não costumava ouvir os outros, mas depois de amigos esfregarem evidências em sua cara passou a acreditar que ele realmente tinha algum interesse por ela. Recíproco, evidentemente, por mais que ela julgasse irreal demais a atração dele por uma menina tão comum. Por mais que não estivesse apaixonada tinha consciência do quando ele era um homem sensacional a ponto de se perguntar como não se apaixonava. O tratamento era impecável: sem frescuras, mas com cuidado e demonstrando sempre que era lembrada. Atração física? Bom, da parte dela ocorria desde a primeira vez que o viu, a ponto das amigas lembrarem os comentários no dia seguinte.
Era a melhor companhia dos últimos tempos, sem dúvida nenhuma. Inteligente, divertido. Horas de conversa podiam acontecer sem que em momento algum houvesse um desinteresse por parte de ambos. Sempre tinha algo para contar, mesmo sem saber que conhecer coisas novas, histórias novas e aprender coisas novas eram dos maiores atrativos para ela.
E lá estavam eles, entre olhares e dúvidas que quanto mais esclarecidas parecem ser, maiores tendem a ficar. Envoltos pela confusão que é a realidade humana. Soterrados pela falta de certeza e a dificuldade que a impossibilidade de sinceridade imposta pela sociedade traz de presente. Esperando, aguardando. Ansiedade.