domingo, 24 de agosto de 2008

Oh, Suzy Q...

O instante em que amasso papéis é valioso. É o único que me distrai da confusão. É o único no qual não penso em palavras para descrever-te: ilusório, incompleto, inerte, irrevogável. As palavras me sobram, jorram, pulam inquietas, iguais às minhas mãos, que vão escrevendo bilhetes, escrevendo na linha torta que sai do papel e avança, avança, chega a parede, chegará aos meus braços.
Começarei a escrever em meus braços, para me lembrar de ti.
Começarei a escrever em meus braços, para marcar o quanto estas palavras me afetam. Não me doem. Nem me surpreendem. Sobem, descem, vão me atingindo, não resta mais um pedaço de pele sem elas.

Ilusório, incompleto, inerte, irrevogável.

segunda-feira, 28 de abril de 2008

enxerto.

-Eu queria me apaixonar por você - disse a ele, me escorando na parede. Pedro riu.
-E por que não se apaixona?
-Porque não sei como. E não sei se você iria gostar de mim. Essas coisas só têm graça quando são de mão dupla.
-Claro.
-Você é apaixonado por ela?
-Pela Marcela? Não.
-Nunca foi?
-Não sei. Talvez não. A gente sempre foi muito amigo, desde os 15 anos, aí é fácil você ficar com uma pessoa assim, poupa o trabalho de sair por aí, pedir pros amigos te apresentarem alguém, procurar assuntos interessantes quando se conhece alguém que parece legal...
-Você não acha que isso é covardia?
-Falou a mulher que acabou de dizer que não sabe como se apaixonar.
Comecei a rir, ele me acompanhou. Acendeu um cigarro, pedi que me emprestasse o isqueiro. Pedro encostou na parede,o cinzeiro ficou entre nós.
-Nunca sei como essas coisas funcionam. Se fosse pra me apaixonar, eu deveria ter sentido alguma coisa logo que te vi, 'cê não acha?
-E não sentiu?
-Te achei bonito. Não senti tesão, de primeira, te achei charmoso, sabe? Mas digo algo mais profundo.
-Sei lá. E por acaso tem regra de como as pessoas se apaixonam?
-Acho que ninguém se apaixona bebendo cerveja, espantando o tédio com telefonemas fora de hora e indo pra cama uma vez por semana. Isso é moderno demais pra mim.
-O problema é que você quer colocar rótulo em tudo. E ainda é negativa e egocêntrica.
-Falou o homem que me disse que não sabia o que estava fazendo da vida. Isso é ser negativo.
-Isso não é ser negativo. É ser humano. O problema é que você se acha menos que todo mundo. Essa é a parte do negativa. E quer que todo mundo concorde. Essa é a do egocêntrica. Como é que você sabe que eu não ia gostar de você? Eu tô aqui, significa que gosto. Pelo menos um pouco.
-Você tá aqui porque nós... temos um affair... você é um homem comprometido e eu sou uma egoísta - tentei fazer cara de cafetina francesa ao pronunciar 'affair'. Pedro me deu a melhor expressão de frustrado que conseguiu.
-Você é tão egocêntrica que não quer se dar ao trabalho de descobrir o que eu penso. Se eu iria gostar ou não. Se valeria a pena fazer algum esforço ou se é melhor deixar as coisas como estão.
-Só acho que certas coisas se resolvem por si mesmas. Como isso aqui.
-E depois eu que sou covarde.
-Ok, já entendi, você tá doido pra que eu me apaixone.
Pedro apagou o cigarro, e tirou o cinzeiro da cama, se deitando em seguida. Perguntou se eu me incomodava em apagar a luz. Eu a apaguei e deitei de costas para ele. Pedro me puxou para si e me deu um beijo na nuca.
-Eu acho que você ia ficar tão apavorada se começasse a gostar de mim que ia acabar fodendo com tudo. Mas relaxa, eu já percebi que você é uma romântica. E do pior tipo, porque é daquelas que negam. Boa noite.
Dormiu com o rosto enfiado nos meus cabelos. Filho da puta.

quinta-feira, 10 de abril de 2008

/adaptações, inconstâncias e dois canos fumegantes.

Eu quero amar você por dois dias, duas noites, poucos segundos, grudar minha boca no teu ouvido e te derreter de gemidos e desespero. Que eu vou morrer se não te amar. De fome, de sede, de cansaço, de desejo reprimido. Que eu vou doer se não te sentir. É falso, a gente sabe, mas é tão legal fingir que estamos interessados um no outro. Eu quero sumir, mas não esqueço da vontade de te ver. Eu quero chorar sem perder o traço do rímel. Beber sem borrar o batom. Purgar sem machucar por dentro. Eu vou morrer, de mentira, se não te amar. Paixão de mentira, nós somos reais apenas enquanto tua língua está na minha e o teu suor se espalha na minha pele.
Contei 15 fios do teu cabelo espalhados na minha cama.
O teu cheiro está no meu travesseiro e nos lençóis.
Estes já foram para o cesto de roupas sujas e em breve estarão de volta, puros, virginais. Os fios de cabelo, voaram pela janela, assim como as cinzas dos nossos cigarros e as lembranças de ontem.
Pra quê, se nenhuma delas valerá a pena daqui a pouco, se você não vai passar de um nome perdido na agenda do celular?

/agosto, 2007.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Bye.

Desculpa, mas eu vou embora. Nem sei se volto porque, se houver retorno, não vai ser o mesmo – não existe ruptura sem cicatrizes. A palavra voltar às vezes me parece tão sem sentido, na verdade... As únicas coisas em mim (ou em nós) que conseguem ser eternas enquanto duram são essas pausas.

Minhas pausas. Nossos espaços.

Parece imperceptível a sutileza desse deixar que não se afirma como definitivo, ou não? Eu já nem sei que aparência isso tem. Me perdi no meio de tantas projeções. Qual é o reflexo real nessa casa de espelhos? Cacos, partículas de realidade, ou de sonho.

Nenhum.

Eu pergunto pela saída, mas todas essas vozes me dizendo por onde seguir só me deixam ainda mais perdida, então eu vou pra onde houver silêncio. Você me espera, mesmo sem saber se eu volto? Eu já te esperei tanto, talvez seja essa a hora de você confiar em mim. É que eu já nem sei o que tenho a oferecer, não sei mais o que é meu, e sendo eu assim tão sua, já não tenho mais nada aqui pra me manter de pé. Tô indo agora. Apaga a luz antes de sair.

Até mais.

segunda-feira, 3 de março de 2008

Prazo de validade: uma semana

É difícil saber quanto tempo um cara vai levar pra te decepcionar. Dependendo da sua experiência de vida dá até para encaixar o rapaz num estereótipo e fazer uma média. Como um playboy típico, por exemplo. Mais previsível, impossível. Mas tem certos casos onde a coisa já complica.

Imagina você, garota que sempre vai para nights nada a ver com a sua personalidade e que no dia do seu aniversário não está com a menor vontade de ficar nessa mesmice. Aí decide ligar para alguns amigos que curtem rock e arranja um lugar diferente para ir. Avisa logo para toda a galera que essa não é uma comemoração e que é para ninguém se sentir obrigado a ir se não tiver a fim. Num dia de libertação a última coisa que você quer é ficar se preocupando se os seus convidados estão se divertindo. Fala sério, hoje não.

Cerveja pra cá, cerveja pra lá, bate uma certa vontade de ficar com alguém. Mas é melhor guardar a vontade do que acabar com um carinha decepcionante no dia do seu aniversário. Cosmopolitan pra cá, drinks desconhecidos pra lá, você comenta com seu amigo que quer alguém especial. Ele faz uma cara de pena e te paga mais uma bebida.

Na pista de dança você percebe que um garoto que foi com a sua galera está dando em cima de você. Ponto a favor, ele já é mais ou menos conhecido, nesse caso o prazo de validade normalmente é maior. Na tentativa de fazer um cálculo mais preciso, o próximo passo é perguntar para as pessoas de confiança se ele é um cara legal. Cinco pontos a favor, que nesse caso tem peso dois. A opinião dessas pessoas é muito importante.

É, a essa altura do campeonato vocês já estão próximos demais para você pensar em algum ponto negativo. Primeiro aniversário que você fica com alguém legal. Primeiro aniversário que você vai pra onde quer. Primeiro aniversário que você fica bêbada sem se importar com os convidados. Libertação é pouco pra esse dia.

E no próximo fim-de-semana sai todo mundo junto de novo. Já durante o esquenta, na porta da boate, você não entende nada quando o ouve falando, na sua frente, que a menina tal é gostosa, que a outra lá é gatinha. Aliás, você nem sabia que ele era do tipo que chamava uma mulher de gostosa e de gatinha. Eca.

Lá dentro você espera que role uma conversa, que ele diga que essa história de gostosa não tem nada a ver e que te surpreenda com um beijo roubado. Tá, ficar com ele de novo não é lá tão importante assim. Na realidade, o que você precisa mesmo, é não se decepcionar com alguém que você achava que ia durar mais de uma semana.

Aí ele beija outra. Do seu lado. Beija é pouco, eles se comem. E aí, ao lembrar da hora que vocês entraram na boate, acaba rindo sozinha. Lá na porta a moça perguntou o nome dele para ver se tava na lista e coisa e tal. Aí ele diz, “Fulaninho”. E se achando o James Bond, ele completa, “Fulaninho de tal. Só tem um.” Ai meu filho, você que pensa, igualzinho a você tem um monte por aí. E se bobear com o prazo de validade muito maior.


Gente, tô sem tempo então estou escrevendo aqui os mesmos textos que coloco no meu blog pessoal (carolguido.wordpress.com). Pelo menos por enquanto não vai rolar fartura em palavras minhas. Mas só por enquanto.
beijo!

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

Oh, Mrs. Dalloway...

Gostaria de ser apenas qualquer coisa ausente, minha presença me oprime. É injusto passar a vida inteira sem poder estar longe de mim mesma. Claustrofobia. Quem fica só se acompanha de si, e eu não me quero por perto – minhas vozes falam demais. Não quero ouvir o que tenho a dizer, que continue entalado, até, sei lá, até meu organismo absorver. Liga a televisão aí. Uma ode à falta de consciência, e à poeira debaixo do tapete. Vai um vinhozinho? Um beijo sujo, uma trepada insignificante? Só não me deixa sozinha aqui, por favor, eu tenho muito medo, me fala de você, de repente até de mim, mas nada que me leve a grandes reflexões. Onde foi mesmo que a gente comeu naquele dia? Não quero arrumar a casa, vamos evitar esse confronto com aquilo que eu enfiei no fundo da gaveta, enrolado em papel de presente. Presente agora seria não estar presente, então não me deixa aqui no meio dessa bagunça.


Fugir do eu é não poder parar em mim.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Inércia

Não me conforta fazer o que você faz comigo a um terceiro, mas parece que os seus conflitos são contagiosos. Sua covardia nega, e sua inércia pega, mas enquanto você fica aí parado eu não paro nunca, continuo em movimento constante, não cesso, não desisto de procurar por aí o que sei que só vou encontrar em você. Não me pergunte o porquê, jamais fui boa em Física, você deve saber melhor do que eu, já que me encontro nessa situação pelas suas razões. O seu lugar sempre foi o meu motivo, mesmo antes de sabê-lo.

Não é irônico isso de alguém que não sai do lugar atrair os mesmos problemas de uma pessoa que não pára quieta? Você atrai e afasta, eu procuro e desvio, e assim deixamos um mesmo mar de frustração à nossa volta. Somos o avesso um do outro. Você lembra do meu gosto? Porque eu aposto que você gosta. Mas você nunca vai sair daí. Então vou experimentando diferentes sabores e me deixando degustar, enquanto te assisto corroer o que resta de doce no teu próprio corpo - desperdício duplo.

A gente segue se acabando, virando pó de propósito, queimando quem se aproxima porque estamos no caminho errado, eu atropelando tudo, você parado na estrada, fazendo os outros tropeçarem. Pode dizer que não... A gente se nega mesmo tudo o tempo todo, salvo quando eu acabo voltando pro meu ponto de partida, pra tropeçar de novo em ti. E apesar dos pesares, fico querendo andar em círculos, e desconfio que seja esse o seu desejo também, só pra gente se esbarrar de novo, pra se machucar de novo e se afastar mais uma vez, incessantemente.

Esse texto tem um ano e meio e, felizmente, nem faz mais sentido.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

/ignore!

Me manda um bom dia. Uma palavra, um alô. Um abraço, um fio de cabelo, uma mensagem no telefone, um pouco de ti. Manda para mim os cinco segundos que o teu braço tocou no meu, o jeito que você inclina a cabeça quando fala com alguém, os teus olhos, sempre parecendo perdidos num local inacessível. Manda um sorriso, para que eu possa lembrar de como você é quando ri, porque eu quero paz, e não essa pressa que fica a espreita por todo lugar que eu passo, o tempo que me assusta, rugindo pesado nos meus calcanhares. Manda o teu cheiro, as tuas músicas favoritas, os livros que você nunca leu, os filmes que detestas. Me dá uma tela em branco, ou, melhor, seja a minha tela, limpa, nova em folha. Vou transformar as tuas costas nas páginas que vão receber as poesias que nunca tive coragem de te entregar, e os teus braços e pernas darão espaço aos desenhos que te fiz, os que tu nunca vais ver, porque eles têm cores e formas se confundindo, se atropelando, exatamente como eu, que vivo tropeçando na minha própria ansiedade. Me empresta a tua boca, para que ela treine, junto com a minha, as palavras que não consigo te dizer. Ou então me dá algo para me deixar na expectativa de que vou, logo, perder o senso e tornar minha voz maior que o medo de você não me reconhecer quando eu te disser quem eu sou.
Possivelmente, aquela que vai jogar o papel onde escreveu tudo isso fora, achando um devaneio causado pela falta de sono.
Ou, quem sabe?, o teu próximo e mais improvável amor.